Partir sem olhar atrás.
Hoje venho contar-te como e porquê decidi visitar e conhecer uma região da Índia no mês e ano em que completei o meio século. Fazer 50 anos de vida fez-me refletir profundamente sobre muita coisa.
Toda uma vida e a sua multiplicidade de histórias. Diferentes lugares, pessoas, experiências e tudo o que fez parte do meu percurso tornara-se algo surreal. Como se de um livro se tratasse, encarnando eu várias personagens, em diferentes épocas e diferentes vidas.
O meu viver enriquecera de diversas maneiras a minha “bagagem”, mas tornara-a muito pesada. Demasiado.
Esta não era uma aventura a sós nem de temática Yoga. Ir à Índia representava para mim resgatar o meu espírito livre. Concretizar por fim aquela viagem idealizada aos meus 16 anos.
Para trás deixei o fardo, a roupa, a pele. Carregava apenas um novo olhar.
O plano era uma experiência envolvente com o povo e cultura local. Respeitando os seus costumes, adotando as suas vestes. Deslocações em comboio, autocarro e obviamente tuc-tuc. Estadia em lugares simples, limpos e minimamente confortáveis.
A rota, várias localidades de Kerala, um estado do sudoeste da Índia.
Aproveito agora para agradecer à Diana e ao Igor e ao seu programa “Macro Viagens”, esta maravilhosa experiência.
Consultem a página. Vale a pena.
Esta é a primeira entre cinco publicações que farei sobre esta viagem:
1ª Parte - Partir sem olhar atrás
2ª Parte - O autocarro
3ª Parte - Casamento Hindu
4ª Parte - O Ashram
5ª Parte - Uma família das Backwaters
O dia do meu aniversário foi passado junto ao mar. Para mim um mar especial. O Oceano Índico. Banhar-me nas suas águas quentes trazia-me sensações familiares da minha infância em África. De certa forma esta celebração foi também um renascimento.
Aceder a este lugar não era fácil. Não havia estrada, apenas um trilho entre uma espessa barreira de palmeiras. Ficamos alojados numas cabanas a escassos metros do mar.
As refeições eram confecionadas pela mãe do senhor que geria este pequeno negócio local. A comida era servida em folhas de bananeira. Sobre o centro da verde folha era colocado o arroz branco e à sua volta dispunha-se uma variedade de molhos e acompanhamentos. Além da explosão de sabores, o facto de comer com as mãos (a mão direita, neste caso), convertia o momento da refeição numa autêntica experiência sensorial. Não só paladar e olfato, mas também visão e tato. Levar o alimento à boca com a própria mão trazia intimidade ao ato de comer. Só usar uma mão para formar aquelas pequenas bolinhas de arroz, misturando-as com vários dos acompanhamentos, transportava-me para uma espécia de estado criativo e de mindfulness.
A pacatez do lugar com os pescadores ao amanhecer preparando as redes de pesca. As orações cantadas, que desde um altifalante de uma pequena mesquita, se faziam ouvir na praia ao entardecer. O constante cantar dos corvos. Vivências que conferíam àquele lugar um clima muito particular e indescritivelmente belo.
(próxima publicação: O Autocarro)